sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Líbia, três anos depois

Membros da brigada islâmica Misarata disparam contra o aeroporto de Tripoli numa tentativa de tirar o controlo a uma poderosa milícia rival, em Tripoli, Líbia, 26 de Julho, 2014.
À medida que os governos por todo o mundo encerram as suas embaixadas e saem da Líbia, no meio da violência e anarquia que se apoderou do país, é importante não perder de vista o papel da NATO em aprovisionar um estado falhado que agora voltou para hostilizar toda a gente.

Foi há três anos – Março de 2011 – quando, entre a revolta pela morte de civis às mãos das forças de Muammar Kadhafi, a NATO lançou um bombardeamento de sete meses na Líbia para proteger os cidadãos. A operação rapidamente resultou na mudança do regime e, durante o conflito, 260 aviões de combate fizeram mais de 26,000 missões, largaram 20,000 bombas. Mais de 200 mísseis cruzeiro foram lançados contra alvos Líbios  e muitos civis foram mortos. O Canadá teve o seu papel na missão. Emprestou alguns CF-18 que fizeram mais de 900 ataques e largaram quase 700 bombas.
Quando tudo terminou, em Outubro, o fraco exército de Kadhafi tinha sido destruído, o ditador estava morto e os países da NATO davam palmadinhas nas costas por terem libertado a Líbia de um tirano malvado. Nas suas mentes foi um trabalho bem feito e, em Ottawa, realizou-se uma parada militar para assinalar a vitória.

“Um novo recomeço para a Líbia está no horizonte e nós ajudaremos a que seja alcançado” disse o primeiro-ministro britânico David Cameron, um dos principais apoiantes da guerra, à medida que as bombas caíam.
E depois acrescentou, enquanto a tão apregoada nova era despontava: “A Primavera Árabe está um passo mais longe da opressão e da ditadura e um passo mais próxima da liberdade e da democracia… Nós ajudámos o povo Líbio a libertar-se e agora temos em perspectiva um novo parceiro a Sul do Mediterrâneo.”

Mas assim que os aviões de combate da NATO deixaram os céus da Líbia, o verdadeiro legado dos benfeitores ocidentais no terreno foi uma realidade totalmente diferente. Para as pessoas deixadas para trás a sofrer as consequências seria um pesadelo.
Primeiro, a cidade de Benghazi, cuja situação difícil durante a revolta líbia desencadeou a acção da NATO, é agora o epicentro da violência e anarquia que tem destruído o país. Os mesmos rebeldes que agradeceram a interdição do espaço aéreo imposto em Benghazi com preces de “obrigado NATO, obrigado América” são, alegadamente, membros do grupo que atacou o consulado dos EUA na cidade, matando o embaixador Christopher Stevens e mais três americanos. Milícias fortemente armadas ocuparam territórios e o recomeço idealizado por David Cameron reflectiu-se numa onda de raptos, assassínios, violações e decapitações que agora assola o país. Mais de 200 pessoas morreram devido aos vários confrontos das várias milícias pelo controlo do território. Vários países têm tentado desesperadamente evacuar os seus cidadãos. Não é bom sinal para o futuro quando os libertados perseguem os libertadores. O suposto governo é demasiado fraco para fazer alguma coisa, considerando que tanto o Primeiro Ministro como os líderes políticos podem ser raptados à vontade.

Ainda mais grave é o resultado do falhanço da NATO em assegurar o controlo das armas deixadas para trás depois da queda de Kadhafi. Sem uma autoridade central forte, vários grupos rebeldes e milícias arrecadaram o que consideraram como despojos da guerra, sendo a Al-Qaeda no Magreb Islâmico a maior beneficiária. As armas estão a ser usadas não só para causar problemas na Líbia, mas também para fomentar a violência no Mali, Nigéria, Chade, Somália e Norte da Nigéria. A maior ironia é que a operação da NATO, que pretendia promover a liberdade e democracia na Líbia, acabou por fortalecer a Al-Qaeda.


A Líbia desapareceu das manchetes mas o que a NATO nos diz é que o Ocidente nem sempre tem as respostas e soluções. E às vezes tem de o admitir. Uma chuva de bombas, lançada da segurança de um avião de combate ou de um navio, sobre um exército pobre é a parte mais fácil. A parte difícil é gerir o desagradável pós-guerra. Os países da NATO saíram da Líbia há muito, mas à medida que o país caminha para a anarquia poder-se-á tirar uma lição importante para todos: as bombas não compram a liberdade ou a democracia.

Mohammed Adam

7 comentários:

  1. Eu admiro o seu interesse e sabedoria por estes assuntos, mas confesso que não tenho a mínima ideia do que se passa... E possivelmente tenho idade para ser sua mãe. É vergonhoso, mas é a verdade. Calculo que a sua família tenha em sim um imenso orgulho. Obrigado por fazer chegar até nós estes artigos.

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  2. não posso comentar, não domino mesmo o assunto :\ por mais estúpido que possa parecer...

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  3. Tudo isto porque em tempos Kaddafi quis começar a vender petróleo em Euros!??? Não entendo esta cena

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  4. andam lá a meter o nariz e a chafurdar no petróleo para se orientarem. E quando é que há eleições?

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  5. Há pessoas realmente... Isto já nada tem a ver com o petróleo, mas sim com o controlo que os extremistas querem ter em diversos países árabes. Parabéns pelas chamadas de atenção. Não sou portista, mas sigo o blogue e é incrível como é uma pessoa tão, mas tão inteligente e sensível aos problemas do mundo.

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  6. Um conflito que se formos a ver bem qual é o fundamento? Quantos existem no médio-oriente, alguma explicação passível de ser ouvida?

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